Errando por influĂȘncia đâ”
A receita de textos genéricos, impessoais, comuns e mais do mesmo.
Tempo de leitura: 2 minutos e 52 segundos
Temas principais: Encontrando sua voz na escrita, o perigo das conveniĂȘncias, aprender criando.
â” Veleiro
ReflexÔes e dicas pråticas
Sempre amei cantar.
Inclusive jĂĄ mostrei no Instagram minha veia artĂstica neste, neste e neste reels. Sendo assim, quando amigos me convidaram para entrar em um coral de mĂșsica pop aqui em Londres, nĂŁo pensei duas vezes.
Tirando karaokĂȘ, essa Ă© minha primeira experiĂȘncia cantando em grupo e na companhia de pessoas sĂłbrias. JĂĄ no primeiro ensaio, encontrei um obstĂĄculo inesperado.
Neste coral, as pessoas sĂŁo divididas em trĂȘs grupos: tenores, altos e sopranos. Faço parte do grupo de tenores. Na semana anterior ao primeiro dia de ensaio, recebi um arquivo de ĂĄudio para aprender os trechos da mĂșsica e o tom em que deveria cantĂĄ-los.
Nerd que sou, me preparei escutando o ĂĄudio incontĂĄveis vezes para me familiarizar com o arranjo. No dia do ensaio, cheguei confiante que tinha aprendido minha parte.
A confiança desapareceu logo que o coral inteiro começou a cantar ao mesmo tempo. Influenciado pelas pessoas dos grupos alto e soprano, eu involuntariamente ajustava minha voz para soar igual a elas porque parecia que eu estava cantando no tom errado.
Ontem foi o segundo ensaio e me sai melhor. Para me manter no tom certo, estou aprendendo a focar na minha própria voz mesmo na presença de vozes diferentes.
Isso me fez pensar em comparação, no tanto de vezes que, apesar de jå ter encontrado minha voz na escrita, me deixei influenciar pelas vozes ao meu redor.
Também observo isso o tempo todo na escrita das pessoas com quem trabalho.
Pessoas com dificuldade de encontrar sua voz porque só conseguem escutar as vozes das pessoas ao seu redor. Ou pessoas que jå encontraram sua voz, mas seguem se comparando e, assim, alimentando suas inseguranças. O resultado são textos genéricos, impessoais, comuns, mais do mesmo, que soam como todo mundo e, por isso, soam como ninguém.
Passei anos preso nesse lugar, deixando que as vozes de outras pessoas dominassem meus textos. Elas pareciam mais criativas, mais confiantes, mais inteligentes.
Estudar textos que admiro me ensinou o que eu mais precisava aprender: a escrita ressoa no outro quando a gente aprende a soar como nĂłs mesmos.
đ§ BĂșssola
Respostas para perguntas enviadas por leitores
âDiego, agora que as inteligĂȘncias artificiais sĂŁo capazes de criar textos melhores que eu consigo, vale a pena melhorar a escrita?â
Agora que a gente pode saber da vida dos amigos pelas redes sociais, vale a pena encontrar eles ao vivo?
Agora que a gente pode ver fotos e vĂdeos de qualquer lugar do mundo, vale a pena viajar?
Agora que a gente pode trabalhar, estudar e se divertir em casa, vale a pena sair para a rua?
NĂŁo sei vocĂȘ, mas eu nĂŁo quero viver apenas para cumprir tarefas da forma mais conveniente possĂvel. Quero estar com pessoas, viver experiĂȘncias, me movimentar pelo mundo.
Para mim, a pergunta que vocĂȘ realmente fez Ă© esta:
Agora que as inteligĂȘncias artificiais conseguem pensar por mim, vale a pena aprender a pensar melhor?
NĂŁo sei vocĂȘ, mas eu nĂŁo escrevo apenas para os outros me entenderem. Escrevo tambĂ©m para me entender melhor. Porque uma das liçÔes mais importantes que aprendi na prĂĄtica Ă© que a qualidade do meu trabalho e da minha vida tem conexĂŁo direta com a qualidade dos meus pensamentos.
A gente estå preso dentro da nossa cabeça para sempre. Melhorar a escrita é investir em conhecer, organizar e transitar nesse espaço com confiança.
Vale a pena investir tempo e energia nisso? SĂł vocĂȘ pode se dar essa resposta.
đ Ondas
IndicaçÔes e referĂȘncias
Uma reflexĂŁo sobre criação, que vi na newsletter do David Perell (tradução do inglĂȘs minha):
âO ato de criar tambĂ©m muda a forma como vocĂȘ consome. De repente, vocĂȘ nĂŁo apenas absorve o conteĂșdo. VocĂȘ absorve a estrutura, os truques retĂłricos, e todas as formas como criadores tornam seu trabalho envolvente.
Ă como uma visĂŁo de raio-x. Conhecimento do seu ofĂcio transcende o intelecto e entra no corpo. Eventualmente, vocĂȘ entende coisas sobre criatividade que vocĂȘ nĂŁo poderia prever quando estava começando.â
O que vocĂȘ vem tentando aprender na teoria sem sucesso?
Como vocĂȘ pode aprender sobre isso criando algo na prĂĄtica?
Que passo vocĂȘ pode dar hoje para fazer isso?
Até semana que vem.
Abs, Diego
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Nerd como vocĂȘ Ă©, imagino o Ăłdio que nĂŁo ficou de fazer "tudo errado", tendo se preparado tanto! Fico sĂł imaginando suas caras!!
Ri algo com o GIF porque imaginei o coral todo caindo por causa dos atropelos!
Adorei sua reflexão sobre fazermos parte de um coral e focarmos na nossa própria voz. No final, todo mundo sai ganhando: nós, por nos desenvolvermos, o restante do coral, por enriquecer o próprio coral, e os ouvintes. Esse é o próprio desenvolvimento da arte e da voz, e consigo fazer muitos paralelos com a comparação que fazemos na nossas carreiras. Obrigada pelo texto!